quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Papai, mamãe e cataventos

Você conhece a suástica? É aquela cruz que parece um catavento. Bonitinha até. Adoraria tê-la criado. Só que a autoria não é minha. E nem tem como saber muito bem de quem foi. Pois ela já era utilizada por budistas, hindus, astecas e uma porrada de povinhos mais antigos que Adão e Eva. Coisa de bem lá atrás mesmo! Pergunte a qualquer bom arqueólogo e ele irá confirmar. Ou vá na Wikipedia, mais fácil. Ela é um bom exemplo para ilustrar que a arte é tão antiga quanto o homem. 

É também conhecida como cruz gamada e representava um monte de coisas bacanas como felicidade e boa sorte. Tipo um trevo de quatro folhas de nossos tatatatatatatatatatatataravós (desculpa, não sei quantos “tatás” preciso escrever para chegar ao berço da civilização). A suástica desenha tão bem e significa tantas coisas boas que eu até a tatuaria no meu corpo. Se não fosse por um único porém: um rapaz chamado Adolf Hitler chegou antes de mim e a tatuou na história da humanidade. 

Por causa deste notório austríaco, a suástica hoje representa o que há de pior no ser humano. Tornou-se um símbolo abominável e evoca a grande atrocidade que foi o nazismo. Logo, não sugiro estampá-la na roupa. Sequer no corpo. E não adianta remeter à ancestralidade do cataventinho conceitual que não vai rolar, meu bem! Você pode até ter o bigodinho do genocida desenhado na sua periquita, mas a suástica pode esquecer! Melhor tatuar um asterisco e torcer para que nenhum megalomaníaco o use como logotipo no futuro. 

Pois é assim que funciona esse lance muito doido chamado cultura: símbolos e ideias são reféns de quem os propagam. E estarão à mercê das ações destes mesmos indivíduos. Logo, um desenho que outrora representava tantas coisas positivas, pode se tornar uma marca digna de condenação. Assim foi com a suástica. E assim será com a família. 

Você conhece a família? É aquela instituição tradicional que simboliza todo o amor, moral e bons costumes que a civilização tem a oferecer. Deve ser tão antiga quanto a arte e o homem. Também remete à proteção e legado. Não é incrível? Mas, de repente, você me interrompe para a pergunta que não quer calar: o que a suástica tem a ver com família? Ao que eu respondo para calar a pergunta: tem muita coisa a ver! 

Atualmente o que é a família senão um símbolo que procura evocar toda a sorte de valores sólidos e respeitáveis? Isso mesmo! Estou falando daquele monte de bonequinhos de palitinho horrorosos enfileirados lado a lado na traseira de automóveis que, além de tudo, informa o sequestrador com quantas crianças ele pode fechar negócio. Mas o que vale é a intenção do desenho, não é?

Família é um tema universal. Sempre tem alguém que coloca a família em primeiro lugar. Ou que sente saudade da família. Que deve tudo a ela. Ou, inclusive, que não se dá muito bem com a parentada e, por isso mesmo, vive arrastando corrente.

Ou pelo menos vivia.  

A família está na corda bamba. Junto com a moral e os bons costumes, ela está no paredão deste imenso reality show que é o mundo. Algumas pessoas que conseguiram chamar a atenção pelos motivos errados, tipo o serelepe Adolf, estão querendo fazer dos valores familiares uma nova tatuagem na história da humanidade. E novamente o desenho vai sair borrado.  

A patotinha fundamentalista dos Felicianos, Bolsonaros, Sônias e companhia limitada (limitada, no caso, ao seu próprio poder aquisitivo), está cagando no maiô branco do retrocesso. Um belo dia, acordaram e tiveram a brilhante ideia de anunciar que são os representantes oficiais da família. Mas, peraí? A família de quem esse pessoal representa? Além da própria, é claro. 

A família é a nova suástica. Um ícone que pretendia remeter a coisas boas até que oportunistas de plantão resolveram usá-lo para fins de campanha política. E é por isso que as próximas gerações, tal e qual filme de ficção científica, vão acabar se reproduzindo em laboratório de forma fria e sistemática. Porque, no futuro, a família será uma ideia pejorativa demais. Tipo um palavrão. Rapaz de família será o novo filho da puta! Esta será a (falta de) sorte de um símbolo sequestrado por meia dúzia de equivocados que semearam a violência e o preconceito para alcançar o poder. Tudo em nome da família. 

A boa notícia é que o futuro ainda não está escrito. Então não espere o Schwarzenegger aparecer, assim de repente, na sua sala e falar “hasta La vista, baby”. 

A cruz gamada já era. Está morta e enterrada junto com Hitler. E a família? Acredito que ainda está em tempo de resgatá-la da sarjeta. Ou vamos deixar qualquer um condenar mais um belo catavento antes que seja tarde demais? Cataventos não foram feitos para serem enterrados. Mas sim para rodarem ao sabor do vento.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Morri.

Tem gente que morre de medo de avião, imaginando um desastre aéreo. Mas se já morreu de medo, não estará vivo para a queda. Outros preferem morrer dormindo, para não se fazerem presentes na ocasião do óbito (morri e não me avisaram?). 

Há os que desejam uma morte lenta e dolorosa para seus desafetos. E para os afetos, que nunca morram, na ingenuidade de desconhecer que a vida eterna é um grande suplício. Tem gente marcada para morrer. Ou que morre, assim, de repente. E ainda aqueles que vão embora aos poucos. Morrem para descansar. 

O seguro morreu de velho e a curiosidade matou o gato. Dá pra morrer de susto, de calor ou frio. E os ultrajados morrem e não veem tudo. Gulosos que morrem de fome. Recalcados que morrem de inveja. E luxuriosos que morrem de vontade. O pecado é mortal. Mas só a virtude faz morrer de tédio.

Tenho esperança em morrer de rir. Todo dia. Mas minha causa mortis já está decretada desde agora: morrerei de nostalgia. Uma overdose de saudosismo.