segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Primeiras pessoas do singular

Boa tarde a todos. Estou muito feliz de estar aqui hoje com vocês, neste encontro dos Autólatras Anônimos. Estou aqui para dar o meu depoimento... Hoje, e só por hoje, eu não postei nenhuma opinião no meu perfil virtual. Ainda...
Bom, pra começar, o meu nome é Guilherme Luiz, vulgo Guilú. Provavelmente eu estou adicionado em alguma rede social de pelo menos metade das pessoas do recinto. Eu sei que sim. Tá certo que aqui é o encontros dos autólatras “anônimos”. Mas antes de ser um anônimo, eu sou um autólatra. E a autolatria é um vício muito difícil de superar. Então, eu não admito o anonimato.
Na verdade, eu nunca fui narcisista. Sequer tinha vaidade, fosse ela física ou intelectual. Inclusive, na minha casa só tinha um espelho que ficava no banheiro. E ele só pegava do peito pra cima. Eu era um cara normal e ia levando a minha vida. Minha condição de autólatra veio junto com a internet. Uma amiga me convidou a montar um perfil no Facebook. Aceitei na inocência... Mal sabia eu que seria o começo do fim.
Uma rede social é um altar para a autolatria. Qualquer abnegado, cedo ou tarde, é convertido num devoto de si mesmo. Basta postar a primeira bobagem que sirva só de legenda para ações corriqueiras, como “fui beber água” ou “carregando o celular”, que é dado o primeiro passo para o caminho sem volta da produção de lixo verbal não reciclável.
Você pensa que está no controle, (óbvio, afinal, todo autólatra pensa que está no controle), mas na verdade você é dominado por uma energia que vai te consumindo. É mais forte que você. Chega uma hora que não basta postar frases aleatórias no seu mural. Você tem que comentar a postagem de seus contatos virtuais. E, além de comentar, curtir as bobagens alheias. E curtir os comentários das bobagens... Ah, e curtir fotos. E comentar as fotos curtidas. Mas fundo do poço mesmo é comentar a mudança de estado civil das pessoas. Acho que é culpa daquele coraçãozinho que aparece. Sei lá, ele grita na tela...
De repente você se pega no Google, pesquisando sites de citações para alimentar a fogueira de opiniões gratuitas que arde no seu monitor. Vale tudo: de Aristóteles a Ari Toledo. Se render uma profusão de letras K nos comentários conta pontos.
Até que chega o momento em que só o monitor do seu PC não basta. E você se desfaz do seu plano de saúde para poder bancar um smart phone com acesso remoto de internet. É o ponto em que sua vida vira um desastre completo. Você não consegue ver um filme de cinema, dançar numa festa, conversar no boteco... Nada! Você está ali, com a cara enfiada no aparelhinho, e seus dedos lutando para construir palavras num teclado impossível para mãos humanas. A tela touch screen deve ser alguma forma de castigo divino. De brinde, uma cifose crônica. E, neste ritmo, você vai perdendo a postura, a compostura, os amigos, a casamento e a promoção no trabalho... A destino do autólatra é um só: a masturbação.
Por isso eu procurei vocês, do Autólatras Anônimos... Não que eu realmente queira me curar. Aliás, muito antes pelo contrário: quando eu soube que tinha um pequeno palanque com púlpito e microfone, não pensei duas vezes em vir pra cá dar minha opinião. Alguém quer comentar? Alguém vai curtir? Se quiserem compartilhar algum trecho do depoimento, aquela parte “devoto de si mesmo” é do caralho! Não se esqueçam de linkar o meu nome. Eu sou Guilú! Me adicionem!